Especial: a sinceridade e competência em Géverton Duarte

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No século XXI vivemos uma época muito evoluída em diversos setores da sociedade. No futebol não é diferente, exceto por esta evolução levar o esporte para um lado mais pragmático: nos deparamos, diariamente, com jogadores e técnicos treinados midiaticamente para falarem frases prontas e objetivas, usando as redes sociais em aparelhos modernos para se aproximarem de forma simbólica de seus fãs.

Mas no estádio Nicolau Fico, encontramos um personagem totalmente oposto ao clichê boleiro hoje em dia. O técnico do Farroupilha e ex-jogador de sucesso,  Géverton Duarte, tem como principal virtude a sinceridade. Declara aos microfones exatamente o que está sentindo, como se estivesse desabafando para um amigo. Foi aos microfones (gravadores, na verdade) do Rede Esportiva, que Géverton também se declarou avesso às últimas técnologias. “Se me mostrarem um ipod desses, eu sou capaz de misturar no feijão e mastigar”, exagerou o treinador sincero e bem humorado.

É este Géverton Duarte, o terceiro personagem entrevistado pelo Rede Esportiva para a série de reportagens especiais. Na entrevista, Géverton compartilhou experiências de sua carreira como jogador. Falou sobre suas decepções, suas conquistas, seus planos e seus medos. Além, é claro, de uma porção de “resenhas” que só Géverton Duarte é capaz de nos proporcionar.

Géverton Duarte concedeu entrevista exclusiva ao Rede Esportiva (Foto: Elison Bitencourt)

Géverton Duarte concedeu entrevista exclusiva ao Rede Esportiva (Foto: Elison Bitencourt)

SUCESSO NO GRÊMIO

Géverton vem de família humilde. Nascido em Rio Grande, o futuro volante fez sucesso no Grêmio, mas começou no Inter. “Era 1987 e eu fui fazer um teste no Internacional. Não passei, mas tinha um olheiro olhando o teste, gostou de mim e me levou para o Grêmio. Tive contrato com o Grêmio até 95?, revelou Géverton.

No Grêmio, Géverton foi campeão gaúcho e campeão da Copa do Brasil. “Lá, eu senti pela primeira vez que estava realizado. Você sair do túnel do vestiário e dar de cara com aquele estádio Olímpico lotado te arrepia todo. Jogar do lado do Valdo, que foi um dos meus ídolos, é uma sensação inexplicável. É foda”, concluiu.

SUCESSO POR TODO O BRASIL

Géverton, terceiro em pé da esquerda para a direita, na equipe do Farroupilha que subiu para a Segundona em 2001. "Foi uma das maiores alegrias da minha carreira (foto: reprodução facebook)

Géverton, terceiro em pé da esquerda para a direita, na equipe do Farroupilha que subiu para a Segundona em 2001. “Foi uma das maiores alegrias da minha carreira (foto: reprodução facebook)

Em 15 anos de carreira como jogador, Géverton atuou em 19 clubes. “Como eu era um jogador da casa do Grêmio, eles me utilizavam muito como moeda de troca”, revelou. Isto fez com que o volante rodasse o Brasil.

“Um dos times que mais me marcou foi o Criciuma, joguei lá em 1993 com o Sérgio Ramires. A estrutura do clube era muito grande. Pagamento de 15 em 15 dias, Centro de Treinamento, o que para clube de interior é quase um delírio”, afirmou o volante.

Géverton se considerava um volante técnico e lento. Marcou doze gols na carreira, mas deu inúmeras assistências. O que segundo ele, não se compatibiliza com o futebol de hoje.

– O futebol hoje é muito rápido. Eu era um volante que não tinha muita capacidade de marcação. Com essas mudanças de hoje do futebol, eu dificilmente conseguiria atuar como volante.

Em sua volta pelo Brasil, atuando pelo mundo da bola, Géverton conheceu aquele que é seu espelho para a carreira de treinador que leva hoje. “Trabalhei com o Mano no Guarani de Venâncio Aires e te digo que foi o técnico mais top que eu ja trabalhei. A gente sabia que ele ia ir longe”, admitiu.

SUCESSO EM PELOTAS

Último em pé, Géverton também fez sucesso no Brasil (Foto: divulgação)

Último em pé, Géverton também fez sucesso no Brasil (Foto: reprodução)

Géverton é um dos poucos jogadores que atuou pelos três clubes da cidade: Brasil, Pelotas e Farroupilha. No Farrapo, Géverton participou da equipe que conquistou o acesso para a Segunda Divisão do Gauchão. “Foi um momento muito marcante na minha carreira. Éramos uma equipe apenas com jogadores daqui de Pelotas, trabalhamos muito e conquistamos o objetivo”, completou.

Jogar em Pelotas, hoje sua casa, era especial em vários aspectos, segundo ele. “Pelotas sempre foi diferenciada em termos de futebol. Aqui, as equipes tem uma mídia que nenhum time do interior tem. Mas hoje tem uma vantagem em relação ao meu tempo: o salário. Esses times da Série B vem jogar contra o Farroupilha aqui e fazem uma fumaceira, porque querem aparecer para Brasil e Pelotas, que pagam 10, 15 mil por mês para os jogadores”, afirmou.

DO CAMPO PARA A CASAMATA

Géverton em sua primeira passagem pelo Farrapo, em 2007 (foto: Divulgação)

Géverton conversa com o elenco antes do treinamento (foto: Divulgação)

Géverton se retirou dos gramados aos 33 anos de idade. Algum tempo depois, assumiu seu primeiro trabalho como técnico. “Comecei aqui no Farroupilha mesmo. Em 2006 assumi o time no final de um campeonato. Mas depois acabei não continuando por ser inexperiente e aquela coisa toda, que eu entendi muito bem na época”, revelou.

Com carreira curta como treinador até aqui, Géverton passou por equipes Bagé, São Paulo e tem seu trabalho mais longo agora no Farroupilha. “O segundo semestre do ano passado foi muito bom para mim. Nos classificamos nos dois turnos da Copa Fronteira-Sul com uma rodada de antecedência, o presidente nos manteve, isso tudo é ótimo”, completou o treinador que irá fechar um ano de Farroupilha.

Ao falar sobre o projeto da equipe, o treinador esbanja confiança e entusiasmo. “O projeto é muito bom. O Farroupilha proporciona hoje para 25 caras, estrutura, salário, condições para trabalhar. E a direção está gastando muito dinheiro: pagando em dia, tudo como tem que ser. Se o resultado vai vir eu não sei, porque futebol tem dessas coisas. Mas tudo está feito da maneira que tem que ser feito”, afirmou.

mais: ping-pong com géverton duarte

Géverton falou sobre tudo. Sua carreira, suas decepções, seus planos e algumas ideias sobre o futebol. Confira tudo no ping-pong do Rede Esportiva.

Rede Esportiva: Tu tens algum arrependimento na tua carreira como jogador?

Géverton Duarte: Tenho. Eu saia muito. Eu era um volante passador, mas lento. Se não fosse bem marcado poderia dar três ou quatro assistências para gol em um jogo. Mas a noite te debilita. Eu saí da Quinta com uma camisa, uma calça, um tênis e uma cueca, cheguei no Olímpico vivendo naquele meio era difícil de segurar. De uma hora para outra eu fiquei bonito. E o cara que joga no Grêmio fica bonito mesmo, nem minha mãe me chamava tanto de bonito. E como eu vinha de família humilde era complicado me segurar, não vinha ninguém me dizer para eu parar. É um arrependimento que eu tenho e eu tento passar bastante isso para meus jogadores hoje.

RE: Qual foi o clube que mais te marcou?

"Me arrependo de ter saído tanto para a noite, quando era jogador", revelou Géverton (foto: Elison Bitencourt)

“Me arrependo de ter saído tanto para a noite, quando era jogador”, revelou Géverton (foto: Elison Bitencourt)

GD: Acho que foi o Criciúma. Eu joguei lá em 93 e a estrutura que o clube tinha era sensacional para o nível do interior. Ônibus, centro de treinamento, pagamento de 15 em 15 dias, parecia clube de capital.

Além dos daqui, né? E olha que no meu tempo Pelotas e Brasil nem eram tão estruturados. Hoje estão monstros, principalmente em relação aos salários. Do período em que eu joguei aqui para o de hoje, evoluiu bastante. Hoje todo mundo quer jogar aqui e isso arrebenta até com o Farroupilha. Porque os adversários vêm e fazem uma fumaceira aqui, porque o Farrapo pode dar a projeção para eles de vim jogar em um Brasil ou em um Pelotas.

Sem contar da mídia que tem aqui, que nenhuma outra cidade interiorana tem. Temos quatro rádios cobrindo o futebol, dois jornais. Pelotas é o maior foco de mídia que tem no interior do estado. E isso chama a atenção de bons profissionais, não tem cidade melhor para o futebol. Te dou um exemplo: olha o Leandro Leite. O cara é profissional. Tu vê ele jogando: ele é pegada, é clube, o cara é foda. Não é pegada idiota, só para mostrar para a torcida. Ele dá carrinho dentro do campo, se rasga dentro do campo. E é esse tipo de jogador que a torcida gosta. O tipo de jogador que a torcida pensa: “Porra, se eu estivesse lá dentro, eu ia fazer o que esse cara tá fazendo”.

RE: O que tu acha que mudou no futebol, da época que tu jogava, para agora?

GD: Mudou muita coisa. O futebol evoluiu, é claro. O ser-humano, quando não quer matar o outro, ele só evolui. Hoje tem os materiais como bola, uniformes, repositores, que evoluiram e influenciaram no jogo. O jogo ficou mais veloz, antigamente um jogador corria 6km por jogo, hoje corre 10km.

Eu não sei se poderia jogar no futebol de hoje. Eu era um volante lento, que marcava pouco, mas tinha qualidade no passe.Talvez se fosse para a meia, poderia jogar, mas como volante dificilmente.

RE: Como tu te avalia na profissão de treinador?

GD: Eu sou um cara que entro pouco na internet, mas estudo. Pesquiso na parte de treinamento físico, para colocar dentro de campo e felizmente, consegui comandar equipes bem montadas ao meu ver, que obviamente não vão dar resultado dentro de campo sempre. Mas tem passagens de laterais, balanço de três zagueiros, dois meias marcando a saída de bola adversária dos volantes, mas tem que evoluir sempre. Se eu não evoluir, vem alguém que não jogou bola e toma meu lugar. Mas eu tenho um fator a mais, que são 28 anos vivendo no mundo da bola. Se neste tempo todo, eu não tiver nada para passar para os meus jogadores, é porque eu sou um burro.

RE: Quais são teus objetivos para a carreira?

GD: Tenho muitos. Subir o Farroupilha está entre eles. Depois fazer campanhas boas. Mas vou te dizer o que mais me fortalece para seguir nessa profissão: meu objetivo é ganhar dinheiro. Não estou aqui no Farroupilha por beleza, por mídia. Eu quero ganhar bem, ter uma vida boa, poder ajudar minha família e as pessoas que eu amo. Isto é o que mais me dá forças para seguir trabalhando

mais: frases de géverton

Sincero e espontâneo, Géverton Duarte é certeza de show em entrevistas coletivas pós-jogo seja qual o resultado. Confira a seguir, algumas das “pérolas” soltadas pelo treinador em frente ao microfone.

“Eu não sou cagão, desculpem o termo”

“Meu grito com a gurizada tem cinco centésimos de segundos, nem sei se tem esse tempo aí”

“O jogo foi uma porcaria, eu não vou nem jantar. Não estou com vontade nem de reclamar para o juiz, porque meu time perdeu gol pra caramba. Estou com cara de cachorro que caiu da mudança.”

“Está tudo muito bom, mas é muito pouco pra quem quer vencer”

“Hoje foi a pior derrota nos meus 28 anos de futebol. Não vou nem jantar na volta para casa”.